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Vingadora Sagrada Part.1



Certo dia, a Mulher-Anjo Cecilia , cansada daquela espera infindável, resolveu galgar o monte Tsafon e afrontar sua irmã. Armou-se de sua espada de fogo e tomou a longa escadaria de mármore que levava à contrução de pedra no topo do morro. Ao fim dos degraus , o Santuário do Alvorecer aparecia meio oculto pelas nuvens geladas, um aposento imponentem erguido por largas colunas redondas. Uma forte luz azulada coruscava em seu interior, um brilho que a anjo acreditava ser as emanações do próprio Deus.

        Mesmo através de seu elmo polido , que completava o conjunto da bela couraça , o rosto de Cecilia era austero e demonstrava sua vontade. Sozinha, ela ponderara por anos a fio e agora enfim decidira visitar o Altíssimo , só para ter certeza de que o espírito de Deus continuava adormecido, deitado no santuário , e não morto, como ás vezes suspeitava. Um dia, havia muito tempo, Cecilia contemplara a face do Criador, uma dádiva reservada aos arcanjo - nem os anjos tiveram esse júbilo.E o que ela viu foi fraternidade, amor e compreensão. Então , como teriam os celestiais chegado àquele grau de corrupção ? O paraíso caíra em decadência, e com ele também o mundo dos homens . 

        Mas o caminho ao santuário não seria facilmente vencido. Pandora , a princesa dos anjos, irmã direta de Cecilia, guardava o trono divino e não estava disposta a permitir seu ingresso. Sozinha, ela bloqueava a passagem , brandindo sua espada sagrada, a insuperável Chama da Morte. Envergava um vestido azul claro como os raios da lua adornada por detalhes dourados no peito , que formava desenhos complexos no metal espelhado. Pandora era a mais forte , a primogênita, a herdeira do Criador. Seu cabelo era loiro e comprido. Se avistada por olhos humanos , poucos a reconheceriam como uma entidade celeste, não fossem as asas branquíssimas , afiadas como navalhas.

        O vento ameno da aurora agitou o cabelo da princesa e soou como apito aos ouvidos de Cecilia. A visitante estacou a dez metros da guardiã, na parte mais baixa da escadaria. Silenciosas, as duas gigantes se encararam - Pandora, forte e confiante; Cecilia, indignada e decidida. A invasora levantou sua espada em posição de defesa, segurando a arma com ambas as mãos.

        _ Saia de meu caminho, Pandora. Estou reivindicando o direito de visitar o nosso Pai, Yahweh, em seu leito de repouso. É meu direito como anjo e descendente do Criador .

 

Por um momento, a princesa nada disse. Em seguida, desceu um degrau.

        _Você não vai a lugar algum, cara irmã. Minha paciência esgotou-se. Estou farta de sua insolência. Sou a princesa dos anjos, e isso significa que sou a líder dos arcanjos também. A minha palavra é lei - determinou. Yahweh está dormindo, como sabemos. E não pode ser perturbado. Estou aqui para defende-lo, e não será você ou qualquer outro que me destituirá de minha função principal.

 

Cecilia pareceu ainda mais irritada.

        _ E como saberei que ele está mesmo aí dentro, Pandora ? Você nos diz o mesmo há milênios, insistindo que, um dia , o Criador despertará para punir os injustos. Pois eu digo que este dia chegou. A podridão tomou conta do mundo. Já é hora de sabermos se o que fala é correto .

 

_Atreve-se a questionar meus comandos ? Sou sua irmã mais velha ! Não duvide de sua comandante !

                         

 

    _Veja aonde você nos levou e pergunte a si mesma se é realmente algum tipo de líder. Arthur , arrastou metade dos nossos anjos para uma guerra civil contra nós, e Katherine , nos abandonou, caindo em desgraça. Se você se opuser a mim, que outra arcanjo terá a seu lado ? Pérola ? - ironizou, evocando o nome de todos os inimigos do céu, Pérola , a Anjo sombria, expulsa pela própria Pandora do paraíso, com sua horda nefasta.

 

A Princesa dos Anjos lançou a invasora um olhar de desdém, ao mesmo tempo em que levantava sua espada fulgente..

        _ Eu não preciso de você Cecilia. Não preciso de ninguém.

         

 

Então, a guardiã empunhou sua arma e moveu para o ataque. Suas chamas cresceram, e a luz do fogo sagrado refletiu nos olhos castanhos da princesa. Cecilia sentiu vontade de fugir ante a majestade da inimiga, mas sua pujança o motivou ao combate.

        _Então é verdade, não é ? É verdade o que Katherine disse aos seus anjos ... - Mas, antes que Cecilia terminasse, Pandora alçou voo, abriu as asas e desceu para ferir a irmã com um golpe violento da espada. Ofuscada pelo brilho do sol, a visitante quase não se esquivou, mas conseguiu rolar para o lado no instante preciso.

 

 

Um estrondo titânico abalou a montanha, e a lâmina flamejante tocou a escadaria de mármore, abrindo uma fenda larga no solo. A invasora teria caído pela encosta do morro, não tivesse adejado em reflexo. Ascendeu às alturas e em seguida mergulhou, aterrissando em um sítio acima da guardiã, muito perto da passagem ao santuário. Dando as costas ao perigo, disparou para dentro do templo, subestimando a potência de sua algoz.

         Mesmo entendendo que jamais venceria a impiedosa vigia, Cecilia continuou em trilha. Queria entrar no Santuário do Alvorecer e vislumbrar a face do Onipotente, só mais uma vez, nem que isso lhe custasse a vida. Se o Altíssimo estivesse realmente adormecido, ela teria obtido a resposta que procurava - a de que sua luga ao lado da Princesa dos Anjos Pandora tinha sido legítima. Mas e se nada encontrasse ? E se YahWeh não estivesse deitado em Tsafon ? Essa hipótese a apavorava, mas ainda pareceria feliz, sabendo que desafiara sua tirânica irmã, mesmo que num derradeiro momento. Teria, então, se redimindo de todas as matanças, de todas as catástrofes que promovera, de todos os cataclismoa que comandara.

        Correndo e voando, ela pulou ao interior do edifício, venceu as colunas e ultrapassou o umbral de entrada. Uma luz intensa confundiu seus sentidos, mas logo a vista se adaptou à claridade. No centro do grande aposento, surgiu um pedestal trabalhado, e sobre ele descansava um livro grosso, de aparência antiga, escrito por dentro e por fora. Aquele era o Livro da Vida, um magnífico artefato deixado a Princesa dos Anjo pelo próprio Deus, e que revelava em detalhes toda a história do sétimo dia, desde a criação do homem até o crepúsculo dos tempos. Estava marcado com o código secreto dos malakins, um idioma anterior à aurora do mundo. Pandora nunca deixava que qualquer um se aproximasse do tomo, a sua obsessão pelo objeto chegava a ser psicótica.Quando percebeu o que se passava, Cecilia sentiu as costas rasgarem em um corte abrasado. A dor do fogo queimou suas asas, e o sangue escorreu pelo ferimento. Como um raio certeiro, a espada flamejante da furiosa Pandora dilacerou suas costas, lançando a invasora ao estado letal. Atordoada , desabou contra o chão, largando o sabre e se esticando à espera da morte. A guardiã pisoteou o busto da visitante , esmagando o metal da pequena armadura dourada. Então, apontou a lâmina ao rosta da irmã, e prelúdio ao choque final.

 

Pandora , você nos traiu! - Protestou a ferida, cuspindo um refluxo de sangue. - Você traiu a confiança dos arcanjos e de todos os celestiais.

        _Eu não traí ninguém, Cecilia. Foi você quem traiu a si própria.

        _Onde está Deus, Pandora ? Onde está nosso Pai Luminoso ?

        Prestes a desfalecer, Cecilia ainda resistia, procurando a resposta à sua busca desesperada. Não distinguira sinais do Altíssimo no templo de mármore, apenas os contornos de um livro envelhecido. O que teria acontecido ao Criador ?

        _ O Onipotente está aqui mesmo, Cecilia. Será que não percebe ? Ele está aqui, no Santuário do Alvorecer.

        Cecilia maneou a cabeça, convencida da insanidade da irmã.

        _ Yahweh está morto, é isso! Ele morreu no fim do sexto dia! Não está apenas adormecido como você contou. Você nos enganou por todos estes anos, Princesa Celeste - acusou.- Eu me sinto envergonhada por ter acatado as suas ordens, mas estou feliz por ter enfim alcançado a verdade.

        Assim , Cecilia se acalmou. A vida estava deixando, mas ela havia cumprido sua missão. Agora, sua essência era vital poderia finalmente se dissipar e regressar ao ventre do infinito. Pronta para a execução, Pandora deteve a espada por mais um segundo.

        _Perdeu o juízo, pobre irmã. Se preferisse esperar só mais um pouco, não estaria agora estendida neste piso gelado. A Roda do Tempo não tardará a anunciar o Apocalipse. Mas não é culpa sua. Você não poderia ter feito nada para evitar o destino. Assim está escrito -Completou, fatalista.

        Então, a princesa levantou sua lâmina, e Cecilia aguardou a sentença.

        _ Não me tome por louca - Acrescentou a Princesa , em inesperado discurso. - Antes aue morra, quero que saiba que só digo a verdade e faço tudo.

 

  Quando a arma encravou, a invasora se contorceu em espasmos de dor. Pandora trespassara seu peito, a parte mais sensível da anatomia angélica, onde está concentrada toda a essência celeste, toda a energia sagrada, todo o poder da aura pulsante.

        Vitoriosa, Pandora se aproximou do pedestal, ondr repousava o livro fechado. Deslizou os dedos sobre as incrições e sublinhou com os olhos os caracteres marcados. Virou-se para trás, para a nave do templo, agors vazia. Então, voltou a atenção ao tomo sagrado. Com um misto de seriedade e loucura , a Princesa falou num sussurro: _ Concordo com você em um ponto, irmã: chegou o dia de Deus despertar de seu sono.